sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

INSTANTÂNEOS - XVIII




























 Desenho de Fernando Micaelo

Era Inverno.
E no Inverno da Galiza, a chuva costuma ser um elemento típico.

Saídos de Tui bem cedo com ideias de chegar ao albergue de Redondela a horas de não haver problemas com apanhar leito livre, foi sobretudo a partir de O Porriño que ela, a água, se manifestou particularmente melosa, inundando-nos constantemente a cara de beijos picados.

Depois de uma jornada que a chuva e o frio ajudaram a endurecer, o corpo pede repouso e recuperação, mais ainda perante a perspectiva de dose idêntica para o dia seguinte. Às 10 da noite (deles) a camarata estava a começar a sossegar, inclusivamente, já se conseguia escutar um peregrino a respirar cadenciado, suavemente sonoro para se ouvir mas ainda sem os requisitos mínimos para se classificar de ronco.

O burburinho habitual dos movimentos de adaptação ao colchão foi reduzindo até ao quase silêncio. Os peregrinos reviam caladinhamente a jornada do dia, anteviam a próxima. É esse ambiente morno de calmaria que Xoaquim precisou de quebrar para partilhar:

- Ó meninos, está-se mesmo bem neste saco-cama.

Ninguém contestou.

Transcorridos não mais que 20 segundos de mudez suspensa, ele entendeu que devia reforçar a sensação de conforto que sentia:

- Podeis mesmo acreditar: está-se mesmo quentinho aqui…

Perante a insistência, Daniel fez saber a sua posição:

- Pois! Eu acredito! mas escusas de continuar a publicitar porque não me convences a ir para aí.