Etapa VII: Trancoso - Ponte do Abade
30 de junho de 2013, domingo
Caminhantes: Benvinda Monteiro, Carlos Matos, Fernando Gaspar, Fernando Micaelo, Inserme, Jaime Matos, Joaquim Branco, Luisa, Paula Marques, Sãozita Branco, Zé Manel Machado. No apoio, Piedade.
Sinopse:
Inicio em
Trancoso 7:30 horas
Distância
percorrida: 23,2 km
Tempo
total de caminhada: 6:15 horas
Tempo a
andar: 5:17 horas
Tempo
parado: 58 minutos
Velocidade
média: 4,4 km/h
Altitude
máxima: 822 metros aos 5Km de percurso
Subida
acumulada 279 Metros
Descida
acumulada 531 Metros
Povoados
e locais de referência ao longo do percurso:
Trancoso,
Sintrão, Montes, Vila Novinha, Palhais, Benvende, Peroferreiro, Lezírias, Ponte do
Abade, rio Távora.
Acumulado:
Caminho: 184,2 Km
Bacias hidrográficas: Tejo, Zêzere, Mondego, Douro.
Distritos: Castelo Branco, Guarda, Viseu.
Concelhos: Castelo Branco, Fundão, Covilhã, Belmonte, Manteigas,
Guarda, Celorico da Beira, Trancoso, Aguiar da Beira, Sernancelhe.
Fonte: GPS de Joaquim Branco
(ver track aqui
O caminho são
caminhos. Nas primeiras 3 etapas procurámos seguir o percurso a que se poderá
chamar “rota da cardosa”, desde Castelo Branco até Belmonte, a qual já vinha
desde o Tejo e cujo nome pode estar associado ao primitivo nome da colina à
volta da qual a cidade albicastrense se desenvolveu. As 3 etapas seguintes que
nos trouxeram até Trancoso incluem-se na que é conhecida por “via da Estrela”, a
qual fazia parte da rota que ligava Mérida a Braga passando pela serra da
Estrela. Não estando estes troços marcados, houve sempre a preocupação em
respeitarmos os percursos do “Caminho”, designadamente, as transposições das
principais linhas de água nas velhas pontes romanas, muito por mérito das
pesquisas e do trabalho do nosso camarada Xquim Branco.
A partir de
Trancoso, entramos no caminho de Torres. De acordo com as pesquisas realizadas, trata-se do caminho
percorrido na primeira metade do século XVIII por D. Diego de Torres Vilarroel,
um salamantino ilustre, da Universidade de Salamanca, que peregrinou a Santiago
através do caminho português interior, com passagem por Trancoso e daqui para
Sernancelhe, Lamego, Amarante, Guimarães, Braga e Ponte de Lima onde entronca
com o “caminho central” que conduz a Compostela. Recentemente, toda esta rota
foi marcada aproveitando o trabalho de Torres. A partir de Trancoso, só teremos
de estar atentos às setas amarelas, sem abdicar, à cautela, do GPS do Xquim
Branco.
Em plena
rotunda junto à porta norte da muralha de Trancoso saudámos a primeira seta,
eram precisamente 07:30 da manhã e, fizemo-nos então ao caminho de Torres. Nos pontos
mais elevados conseguíamos perceber a orografia acidentada da região, preparando-nos
mentalmente para os troços mais inclinados. O primeiro, e mais íngreme da
jornada, apareceu logo ao terceiro quilómetro passada a aldeia de Sintrão atingindo-se a altitude máxima da etapa a 822 metros. A
paisagem soava a inóspita, quase “selvagem”, submetendo-nos à exposição solar
em longos e estreitos trilhos ladeados por grossas e altas giestas, compensando
pela alternância com a frescura do pinhal frondoso, em percursos onde a
intervenção humana deve ser rara, exceptuando, talvez, as placas indicadoras
das reservas de caça. Durante cerca de duas horas não se viu uma horta, só
pinheiros, carvalhos, giestas e barrocos. Já com os santos a ajudar rodeámos as povoações
de Montes e Vila Novinha até encontrarmos o rio Távora que nos surpreendeu com
uma serena e pitoresca lagoa, logo aproveitada para breve mas refrescante pausa.
Prosseguiu-se
em alcatrão ao longo da floresta, retomando a terra batida à entrada de
Palhais, para a aldeia de Benvende. Aqui, alguém se lembrou de perguntar, em
jeito de brincadeira, se a terra possuía uma bica a deitar água. O benvendense
Daniel Batista, homem a aparentar sessenta e alguns, adiantou-se de imediato avisando que não
senhor, a deitar água não, mas a deitar vinho havia na sua adega. Não era produção própria porque o vinho daquela zona não era grande coisa, mas era caseiro comprado em Mêda. A nós soube-nos que nem ginjas. As senhoras
optaram por porto caseiro e todos brindámos à saúde do Ti Daniel enaltecendo a
sua hospitalidade.
Há uma teoria,
na área das ciências do território, que sustenta que a hospitalidade cresce de
sul para norte. O nosso projecto será uma boa oportunidade para a testar
empiricamente. A investigação realizada até agora, privilegiando a técnica da
observação participante, tende a reforça-la, mas, prometemos estar atentos e
seremos implacáveis a declará-la falsa tal como o faria Karl Popper, se formos
maltratados uma única vez. Sim, porque todos os cisnes são brancos até que
apareça um negro. Por isso, gentes do norte, cuidai-vos em nos cuidar!
Foi o que
fizeram as gentes de Lezírias, anexa da freguesia de Souto, concelho de Aguiar
da Beira, que se preparavam para um almoço de confraternização na antiga escola
primária, envolvendo toda a comunidade de pouco mais de 30 pessoas. Aquele que
parecia o “chefe” mandou que nos servissem bebidas frescas determinando com
alguma vivacidade “aqui ninguém paga nada!”. Aceitámos educadamente acompanhando com a
entrada localmente muito apreciada que prima pela simplicidade: cebola regada
com vinho tinto e temperada com duas areias de sal. Ninguém nos soube
satisfazer a curiosidade de saber porque é que chamavam àquilo …galinha.
Ganhámos
alento para a última meia hora da etapa, marcada para a Ponte do Abade, onde
chegámos às 13:45, uma hora boa para almoço. Era preciso um sítio fresco para
estender os farnéis e Jaime encontrou-o rapidamente numa pequena esplanada de
um café junto à estrada, que também era pensão e mercearia, propriedade do Sr
Seixeiro que acumulava ainda com as funções de taxista da aldeia. Não fomos
autorizados, porque o Sr Seixeiro, sem saber da nossa investigação acerca da
hospitalidade, quis contribuir para o reforço da teoria e ofereceu-nos uma sala
já equipada com uma mesa comprida. E quando a Paula perguntou pela casa de banho, foi a de casa que ele abriu. Por ele ficámos a saber alguns pormenores interessantes
sobre a povoação, a começar pela origem da ponte, edificada, segundo ele e a
lenda, para facilitar o trabalho do abade na sua missão pastoral junto da
população do outro lado do rio; e também para permitir a regularidade das suas
visitas a uma amiga do peito que lá residia.
A ponte
propriamente dita, apresenta características romano-góticas e localiza-se na
confluência de dois distritos (Guarda e Viseu), dois concelhos (Aguiar da Beira
e Sernancelhe), duas freguesias (Sequeiros e Ponte do Abade), duas dioceses
(Viseu e Lamego), duas comarcas (Trancoso e Moimenta da Beira).
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