segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Porto de Vacas


Porto de Vacas, 09 de Fevereiro de 2013

A organização chamava assim:

Comemore o Carnaval de forma diferente percorrendo o Caminho do Xisto de Porto de Vacas, um dos seis da rede de Percursos Pedestres do concelho de Pampilhosa da Serra.

Porto de Vacas é a terra natal do Manel Bento. No ano passado teve artes para nos levar a participar na caminhada que a comissão de melhoramentos de Porto de Vacas e parceiros organizaram. Não, a nossa participação não teve nada a ver com o facto de a inscrição, reforço e almoço carecerem de qualquer comparticipação da nossa parte, assumindo a autarquia os custos da operação.

É preciso entender e enquadrar a estratégia que está por detrás deste tipo de iniciativas. Numa análise mais fina ela inscreve-se num paradigma que tem no seu núcleo duro a teoria do intervencionismo compensatório. Em termos mais claros, assenta na ideia de que nos territórios desfavorecidos, de baixa densidade, se se preferir, a fragilidade da dinâmica “civil” tem de ser compensada pela acção das autarquias, sob pena de se agravar o movimento de abandono a que parecem estar votados. No caso, os resultados estão à vista: se a autarquia não tivesse tomado a iniciativa de canalizar alguns dos seus recursos, mobilizando igualmente a câmara municipal da Pampilhosa, os bombeiros voluntários, o projecto aldeias de xisto, e a comissão de melhoramentos, provavelmente, uma boa parte dos cerca de 300 participantes desconheceriam agora que existe uma aldeia simpática, localizada num cenário natural fabuloso, onde se produz um pão de azeite delicioso, um queijo que combina muito bem, aguardentes gulosas de vários travos, tigelada da verdadeira, etc, etc. Nesta perspectiva, poderemos aceitar, que a autarquia não deverá inscrever os custos na rubrica das despesas mas na do investimento. Lá mais para a frente, o senhor que veio de propósito de Lisboa, sózinho, vai querer voltar para descobrir o resto, e trará com ele a família e alguns amigos.



No que nos diz respeito, a nós, confrades, também contribuiu para a decisão de participarmos na caminhada de 2012, a promessa de inaugurarmos um pipo na adega do parteiro do Manel. Sim, que o Manel teve a ajuda do Ti Zé Alfaiate no momento do parto. Confirmado pelo próprio, era ele adolescente imberbe de 15 anos, já fazia pela vida nos negócios do pai do Manel, quando a patroa entrou em trabalhos de parto. À falta do INEM, alinhou o rapazinho. E o Manel lá saiu para enfrentar o mundo. E por aí anda, pesadote.

Já veteranos à conta da (boa) experiência do ano passado, voltámos a aceitar o convite para a edição de 2013, sem ligarmos nada à novidade de que ia haver prova de produtos locais, para além, claro, do almocinho, e lá comparecemos 17 confrades, prontos para ajudar no que fosse preciso.

À descida para Janeiro de Cima, o Zêzere estava coberto por um comprido e sinuoso manto de algodão branco que não deixava ver na sua plenitude o magnífico cenário que enquadra a aldeia de Porto de Vacas. Levantaria ainda antes do início da caminhada.




Sensivelmente a meio, a organização preparou-nos uma pequena lição e demonstração pratica. Um antigo resineiro esperava-nos no meio do pinhal numa curva do caminho que descia ao vale de muro armado de utensílios vários apropriados à tarefa de extrair resina dos pinheiros bravos. Com visível entusiasmo na sua função efémera de professor ia explicando os trabalhos que ia realizando. Começou por remover uma parte da casca na base do pinheiro, depois espetou uma peça de metal ligeiramente aconcavada que servia para direcionar o fluxo da resina para o recipiente de plástico que colocou imediatamente por baixo. Quando tudo já estava en su sitio, pegou numa bisnaga com um líquido esbranquiçado e borrifou a ferida por cima do metal, para, disse o resineiro, “puxar a resina”. Um brincalhão, se calhar um enfermeiro, ainda perguntou se, puxar por puxar, não seria mais prático espetar no pinheiro a agulha de uma seringa e, puxar a resina. Que não! Tinha de ser daquela maneira. Discretamente, Xquim Branco explicitou a questão do “puxar a resina”: o líquido é um ácido que atrasa a reacção do pinheiro para sarar a ferida e permitir assim que a resina continue a escoar por ali. As coisas que o Xquim sabe…

Bom, ficámos também a saber que a resina servia essencialmente para a produção de aguarrás que, por sua vez, era utilizada como solvente e na fabricação de graxas e tintas, e de pez branco utilizado, atenção a esta informação já fruto de pesquisa nossa, para calafetar barris de cerveja (aqui). A extração de resina dos pinheiros já foi uma actividade com alguma pujança em Portugal. Já não é. Parece que o petróleo também possui este tipo de átomos e é mais barato (!).


Os últimos 3 km foram feitos na companhia do Zêzere que ali corre sereno, por via do dique construído mais à frente. À chegada, entraram os bombos de Dornelas do Zêzere, para abrir o apetite para o discurso do senhor Presidente da Junta que reafirmou a satisfação de ali ter mais de 300 pessoas que fizeram uma caminhada “com muito estilo” (sic), e, sem mais demoras foram todos os caminhantes ordeiramente recolher o arroz de feijão e grelhado misto de porco. Estava tudo muito bom.



O Rancho Folclórico e Bombos de Dornelas do Zêzere ofereceram um concerto honesto durante as duas horas seguintes. O que lhes sobra em honestidade falta-lhes em autenticidade. Do ponto de vista do reportório, entenda-se. Mesmo para quem pouco ou nada entende de folclore, soa-lhe estranho que o rancho de Dornelas do Zêzere, concelho da Pampilhosa da Serra, cante e dance o vira do Minho e lhe chame vira do Zêzere.


No próximo ano, somos capazes de estar disponíveis para inaugurar outro pipo.


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